Há Boa e Má Publicidade. Há aquilo que defendemos e aquilo que devemos lutar contra

Não foi a primeira vez que uma campanha de publicidade nacional meteu água ao apostar numa estratégia de marketing que visa promover a discriminação. Isto claro, sempre a par com a promoção de um produtozeco qualquer, seja ele qualquer for.
À uns anos atrás, por altura do euro, era a Galp a incentivar a população a arregaçar as mangas, a gritar pela selecção nacional e a saltar. Sim, a saltar, pois quem não saltasse só podia ser um pane.. e etc e tal.
Com tal slogan, estava a Galp a querer atribuir uma série de predicações pouco dignas à homossexualidade. Primeiro, nomeando-a com uns dos seus epítetos mais ofensivos; Segundo, rebaixando-a pela negativa e pela exclusão ( “quem não salta é..”) como se a mesma fosse algo a desdenhar; e terceiro, a perpetuar o estereótipo de que os gays simplesmente não gostam de futebol, logo estão à parte de tudo aquilo que é “d’homem” e completamente fora de coisas tão heterossexuais como o patriotismo.
Ora, eu sei que a culpa de uma tal acção não se pode atribuir de forma tão directa à companhia que a criou sem primeiro não culpar também uma mentalidade social dominante na qual vigoram todo o tipo de preconceitos latentes de séculos e séculos. No entanto, aquilo na altura afectou-me mais do que se possa pensar.
Sempre gostei de futebol. Jogo-o desde que aprendi a socializar em recreios de escola e a fazer uso das pernas para correr. E no entanto, ali estava a Galp a dizer-me de forma subliminar que aquilo não era para mim e que eu devia era ter vergonha de ser como sou. Para quem acreditava que um dos papéis da publicidade no processo da globalização era o de generalizar conceitos e igualizar padrões sociais, sempre numa perspectiva de integração universal, tal ideia saiu completamente gorada.
Pensei nas centenas de jovens ainda em fase de ajustamento e de adaptação a uma orientação sexual distinta das demais e de como aquilo era propício a lançar mais justificações para se sentirem diferentes e rejeitados. Se pensarmos que a taxa de suicídio dos jovens homossexuais sempre foi três vezes mais alta que a de outros jovens é difícil amenizar a gravidade das consequências que tais acções podem provocar. Isso deixou-me zangado e felizmente não só a mim mas a muitos outros e juntos inundámos as caixas de correio electrónico dos escritórios da Galp com reclamações até que estes se viram compelidos a alterar o anúncio televisivo.
Foi um bom exemplo de como a união, a reivindicação e a persistência andam a par e par com bons resultados. Uma vitória que soube bem.

Agora à umas semanas atrás, os directores de marketing da cerveja Tagus tiveram a brilhante ideia de promover a sua cerveja com o extraordinário slogan “Orgulho Hetero”.
Ora bem, tal frase, simples como é, levantou uma série de opiniões, dissidentes entre si, próprias de uma confronto de convicções.
Eu por mim não partilho da opinião de que tal campanha de publicidade era um verdadeiro incentivo ao ódio e à homofobia. Longe disso. Mas no entanto também não partilho de opiniões como a do jornalista João Gonçalves que escreveu no seu blog que “ no limiar do ridículo, de facto a melhor resposta a um 'orgulho homo' é um 'orgulho hetero' ”.
O que o João Gonçalves não se apercebe é que quando uma minoria se agarra ao conceito de “orgulho” em ser isto ou aquilo, fá-lo por uma questão de visibilidade e de revindicação de igualdades de direitos que não os têm. É como um levantar de braços no meio de uma imensa multidão como que a dizer “Ei! Estou aqui. Não se esqueçam de mim. Sou diferente mas não menos que os outros”. É um orgulho que aclama aceitação.
Quando uma maioria o faz, temos que nos perguntar qual a necessidade com que o faz porque uma vez que está integrada numa sociedade onde a sua ideologia impera, aclama-la é mostrar um sentimento de exclusão para com tudo o que não se insere nos mesmos parâmetros. Inserem-se no mesmo sentido dos slogans alemães dos anos 40 a proclamar “orgulho nazi”.

Portanto eu pergunto, qual era o propósito?

Se a Tagus é uma bebida para heterossexuais, então não é para mim, logo não é para todos, logo é uma bebida elitista que exclui consumidores.
Tudo bem! Se querem delimitar o seu público-alvo isso é lá com eles, pessoalmente só penso que têm a perder.
Mas será que é só isso que fazem passar?
Fazer uma campanha com uma série de imagens de uma juventude “clean”, divertida e feliz e depois rotulá-la e delimitá-la apenas como heterossexual, orgulhosa de o ser, como se não pudesse ser outra coisa é igualmente dizer que os jovens homossexuais são diferentes, estranhos, desenquadrados e fora de todos os conceitos do que é desejável. É um voltar aos mesmos e velhos círculo de perpetuação de preconceitos e criação de estereótipos que nos marginaliza.
O que pessoas como o João Gonçalves ou o escritor Francisco José Viegas que opinou sobre o assunto no jornal de noticias, não compreendem é que não é nada fácil estar a lidar com as repercussões contínuas deste tipo de mensagens que fazem querer crer a ti e a todos os que te rodeiam, que és algo de anormal quando tudo em ti diz precisamente o contrário.
E senhor Francisco José Viegas, não acho que um insurgimento a situações flagrantes deste género, que primam pela exclusão, sejam injustificadas ou atentados contra a liberdade de expressão, tal como não acho que seja preciso vestir a pele de um homossexual para nos identificarmos com qualquer tipo de luta que reclame um pouco de dignidade social ou até humana. Ou é?

Eu por mim aplaudo a Sara Martinho (a.k.a Mrs Cacau) por ter levado a avante ao resto de nós que lhe seguimos, e por denunciar de forma rápida e bem, o caso ao ICAP.
É um outro exemplo de quem não se cala, também não consente.

Ficou por condenar a revista Time out lisboa com a sua campanha “O que fazes em casa é contigo, o que fazes fora... é com a Time Out!” que expôs em cartaz um suposto casal de homossexuais com tendências para o travestismo. Nada de mais, claro, não fosse esse cartaz ter sido promovido com outros que exibem um homem e uma ovelha na cama dando indicação de zoofilia e outros com um homem que esconde um cadáver em vários recantos da casa, sendo que um é uma parafilia e o outro um crime.
A minha questão é porque é a homossexualidade foi posta lado a lado com estes dois conceitos?
Andou a JS a gastar dinheiro com um cartaz enorme no Marquês a promover a igualdade em relação à orientação sexual e veio depois a time out fazer precisamente o contrário para se fazer vender.
Fiz questão de mandar esse reparo à revista mas sem grandes criticas. Afinal de contas a relação não é directa e a revista time out é, apesar de tudo, a única revista dirigida a um público geral que dedica uma secção à homossexualidade, sem discriminações e com uma certa objectividade.
No entanto acho que devo ter exagerado na observância do facto pois mandaram-me uma resposta com um rol de lamentações e desculpas que me fez ficar envergonhado.
Acho que por vezes tenho lata e consciência social a mais.

Só para terminar, uma vez que vem a propósito do assunto fica aqui um dos cartazes que fiz em setembro para o grupo ex aequo Aveiro na sua semana da “diversidade na cidade”. Aparentemente ganhou o prémio de primeiro lugar de um concurso que nem sequer sabia existir.
E já agora, fica também o link para o artigo do Sérgio Vitorino sobre a Campanha da Tagus, que deixou no blog das Panteras -

5 Cool People:

Concordo plenamente com o João. Esta camapnha da Tagus veio pôr a nú o rídiculo das marchas do rogulho gay. Veio pôr a nu a palhaçada das manifs, dos exibicionismos primários... etc. Claro que no limite esta campanha é um dedo na ferida. Eu acusei o toque, apesar de nunca ter sentido orgulho especial por ser gay. Para mim isso nem é tema, quanto mais motivo de orgulho. É humano e normal!

Aquele abraço

dezembro 18, 2007 7:19 da tarde  

Acho que tens uma imagem muito negativa das marchas e das manif ligadas a movimentos lgbt. Percebo que não te revejas naquilo que entendes que é uma marcha. Eu próprio também não me revia antes de me aperceber de que a imagem que perpassa nos media sobre a actuação e o propósito de uma marcha, é deturpada e incompleta. Não são só exibicionismos primários e, concordo contigo, ridículos. É também um conjunto de pessoas que não captam as atenções das cameras por serem comuns em todos os sentidos e que dão a cara em nome de ideais que acreditam. Não acho que isso seja ridículo.
Também nunca senti especial orgulho em ser gay. Mas para mim isso é tema. É tema de se ser precisamente humano e normal. Acho que isso de orgulho passa por aí mesmo.

Abraço grande

E continuo a não concordar com o João Gonçalves

dezembro 19, 2007 1:03 da manhã  

"...que dão a cara em nome de ideais que acreditam". O que não entendo é como é que a sexualidade pode ser um ideal. Vejamos... foi precisamente por alguém começar a acreditar que a raça seria um ideal, que se iniciaram os movimentos xenófobos. Onde nos (vos) levará esse idealismo?

PS- A forma de eu argumentar pode parecer violenta. Mas não ligues, é apenas um estilo. Respeito as pessoas que lutam pela igualdade de oportunidades, mas obrigo-me a distinguir isso das manifs e marchas!

Aquele abraço!

dezembro 19, 2007 4:39 da tarde  

Não é a sexualidade. É a orientação sexual e todas as desigualdades político-sociais que daí advêm. É diferente. E não é um ideal de superioridade. Precisamente o contrário. É de igualdade. De querer que assim o seja aos olhos da lei.

Eu percebo o teu ponto de vista. Ou melhor, não percebo, mas aceito. É obvio que olhamos para o mesmo assunto sob diferentes perspectivas. Isso não quer dizer que estejamos em lados opostos de um mesmo campo.

Nesse assunto da homossexualidade eu vejo as coisas do seguinte modo: Estou muito longe de viver num estado de plena justiça. Por omissão e por desconsideração, a lei coloca-me numa posição de cidadão de 2º categoria, negando-me direitos tão simples como o casamento, adopção, doação de sangue e outros tantos que a maioria tem como um dado adquirido. Eu não quero viver na margem da alternativa, sempre à procura de uma segunda melhor opção. Quero aquilo que acho que tenho direito. Mudar aquilo que é injusto. Alguém tem que o fazer.
Se Manifs e marchas, são ou não o melhor modo de o fazer, esse é um outro assunto. Mas resta dizer que elas são apenas um pequeno ponto de outras acções constantes, mas invisíveis à praça pública.

P.S – Eu não achei que tivesses sido violento :) de modo nenhum. E para que conste, eu também não estou a ser. Isto é só uma troca de opiniões, rapaz :)

Be cool and stay cool. That’s what i always say.

Bj.

dezembro 20, 2007 1:07 da manhã  

hey, desaparecido andas :)

janeiro 26, 2008 3:00 da tarde  

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